À espera do capilé
É o caso dos comitês de cultura, que terá um fundo substancioso para ser partilhado
Por mais que se evidencie o equívoco do PT de transformar o governo em balcão de negócios para os seus pares, não é fácil para a legenda escapar dessa conduta, que está em seu DNA. Sempre foi assim. Mas também sempre foi assim para qualquer outro partido político que chegue ao poder no Brasil. Governo é para ter boquinha.
Por isso a sem-cerimônia dos próprios militantes ‘culturais’ do partido ao afirmarem, diante de uma grana boa que está a caminho, que serão recompensados por serviços prestados no passado, em momentos difíceis. Para eles, não há nada de errado nisso. Ajuda lá, recebe aqui. O partido é o governo. O governo é o partido. Tudo certo.
É o caso dos comitês de cultura, que terá um fundo substancioso para ser partilhado. A finalidade desses núcleos é essencialmente política. De cultura, só tem o nome. Como extensão do partido, os comitês são mecanismos para manter a militância unida. Algum desavisado pode dizer: “Mas será um projeto robusto, para formação e artistas”.
Como vem sendo noticiado, o Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC) foi criado em 2023 e vai custar R$ 58,8 milhões até o final deste ano com ações de mobilização, apoio e formação de artistas.
É preciso ser muito ingênuo para imaginar que algum artista possa ser formado assim. Trata-se apenas de um acerto de contas com dinheiro público. É a parte boa para quem se dedicou ao partido em momentos difíceis. Lula sabe disso e sabe da eficácia de oxigenar os comitês para arregimentar a base, antes que ela se disperse.
Mário Sabino, em sua coluna no site Metrópoles, dá a senha: “Há, então, dois guichês para atender esse monte de Mozart em busca da ‘parte boa’: um para quem foi para a frente da cadeia onde o companheiro Lula ficou preso, em Curitiba, e outro para quem não foi a tempo, talvez acreditando que a Justiça seria mais ágil para soltá-lo.”
A cultura é um território que o PT domina e o manipula com desenvoltura. É redundante a tese de que a produção cultural no Brasil é resultado de uma militância progressista, de esquerda e lulista. O Estado é a fonte do capilé, especialmente para os mozarts que tocam tudo de ouvido. Os comitês, apenas o caminho mais curto para se resolver uma pendência.