A italianidade em Piracicaba, aos 258 anos
Os italianos fazem parte da identidade local e contribuíram imensamente na construção e desenvolvimento da cidade a partir do final do século XIX
Da esquerda para a direita: Leandro Furlan, Wilson Guidotti (Balu), Sérgio Forti, Pedro Maurano, Paulo Checoli, Padre Rafael Verde, Palmiro Romani, Leandro Sabadin e Fauzer Guarnieri. Os três do meio são: Mariana Dedini, Marcia Pompeu e Juliano Dorizotto - Esta seria a legenda da foto.
É uma tradição na imprensa escrever sobre o passado e as perspectivas de futuro de uma cidade na data do seu aniversário. No caso de Piracicaba, são 258 anos de história. Por se tratar de um município dinâmico e em processo constante de transformação, com um roteiro repleto de nuances reveladoras, os recortes possíveis de serem abordados em forma de matérias jornalísticas ampliam muito, e todos eles têm um peso fundamental que se justifica.
Questões como tradição, força econômica, panorama ambiental, dinâmica urbana, mudanças tecnológicas, política, artes e cultura, tendências comportamentais, enfim, ganham força neste momento, pois são aspectos subjacentes que se configuram como realidade. Assim como nosso tema: imigração italiana em Piracicaba, que, de alguma forma, incorpora todas as abordagens acima.
Os italianos fazem parte da identidade local e contribuíram imensamente na construção e desenvolvimento da cidade a partir do final do século XIX, ajudando a compor histórias ricas e envolventes que perpassam todos os setores da sociedade. Pode-se afirmar, sem erro, que, com a imigração italiana, inicia-se uma nova fase da história de Piracicaba.
A amplitude das relações entre seus integrantes com a tradição intelectual e cultural da Noiva da Colina não tem paralelo. O legado dos italianos na economia local é impressionante, basta lembrar de Mário Dedini, Pedro Ometto e Pedro Morganti, os primeiros pilares de uma base industrial invejável. A riqueza artística de seus mestres de obras, arquitetos e pintores se destaca no cenário da cidade, o que pode ser devidamente compreendido pela obra do jornalista Cecílio Elias Netto, “Piracicaba, a Florença brasileira”.
Renascimento Piracicabano
Cecílio, decano da imprensa local, mostra em seu livro algo ainda mais ousado e profundo sobre a relação entre Piracicaba e a Itália. Segundo ele, a cidade, mesmo antes de os italianos chegarem, já havia dado início ao seu renascimento cultural (em analogia ao Renascimento Italiano), com a vinda de Itu de Miguel Arcanjo Benício de Assunção Dutra, a quem ele intitula “o nosso Michelângelo Caipira”, homem de múltiplas habilidades, construtor de belezas, em telas e monumentos. Havia também Almeida Júnior, eleito pelo Império e pela República para ser a referência da Noiva da Colina quando o assunto era 'artes plásticas' e influências europeias.
A partir de Miguelzinho Dutra, uma plêiade de talentos se despontaram no horizonte: João, Joaquim, Alípio, Arquimedes, Joca, Pacheco, Eugênio, Frei Paulo, entre outros tantos. Há espaço também para Tarcila e Julieta, dentre outras forças femininas que contribuíram para compor esse rico cenário. Todos recebem uma atenção especial do autor do livro em questão. Sendo Frei Paulo o continuador de um processo de formação cultural que se sintoniza com a juventude artística local, especialmente com os descendentes de italiano. Assim entram em cena os Nardin, Stella, Sêga... O amálgama estava feito.
Com um panteão dessa magnitude, Cecílio encontra força de sobra para fazer sua 'metáfora' e cravar que Piracicaba se desenhava por inspiração superior, para ser uma Florença Brasileira. O bairro Monte Alegre, por exemplo, está na obra como um sonho de Pedro Morganti. A Capela São Pedro, construída no bairro, fruto da poética italiana.
Volpi é o artista italiano do Grupo Santa Helena que entra em cena para colocar sua marca na história local, com suas bandeirinhas na capela do Monte Alegre. O italiano Carlos Zanotta é outro arquiteto que projeta o portal do Cemitério da Saudade e a sede da Società Italiana di Muttuo Soccorso de Piracicaba. A partir da construção de sua sede, a confraternização entre italianos e Piracicabanos se intensifica. O espaço torna-se ponto de encontro de artistas e público da cidade, a síntese do multiculturalismo local, ao lado do Teatro Santo Estevão.
É na Società que os irmãos Thomazzi deixam suas marcas, em belos afrescos no Teatro Italiano, um espaço arquitetônico inconfundível, que comemora 120 anos de existência, sendo umas das obras neoclássicas raras do interior paulista e do Brasil ainda viva, mas que precisa agora ser restaurada.
Modernidade
Enquanto Cecílio Elias Netto trata do renascimento nas artes, a nova diretoria da Società tem imprimido em Piracicaba um novo movimento, este já bem recente, o de italianidade. Foram necessários apenas alguns movimentos para se perceber o quanto os ítalos descendentes guardam as histórias de seus antepassados e se empolgam quando elas vêm à tona. Desejam a preservação dessas memórias. Este é o momento em que a cidade se reencontra com a força viva da italianidade influenciando projetos que vão além da nostalgia e projetam a cidade para o futuro. Este olhar sensível é, por exemplo, a marca de Juliano Meneghel Dorizotto, atual presidente da Società, um apaixonado por esse movimento vibrante de italianidade em Piracicaba.
É na mesma Società, portanto, em que um Grupo Jovem vê a Itália como grande parceira para intercâmbios empresariais, culturais e científicos, aproximando as novas gerações de iniciativas que atualizam as relações entre os dois países, redesenhando o presente para o desenvolvimento de projetos em comum.
Partindo de um monumento celebrando os 150 anos de migração italiana, instalado no Parque da Rua do Porto no ano passado (2024), até a criação de um Núcleo Jovem, para fomentar intercâmbios com a Itália-mãe, os 258 de Piracicaba devem ser marcados por essa razão de ser de uma cidade diversificada, exemplarmente acolhedora, onde a italianidade se torna caipiraciabana e sentimento de união entre os povos atravessa os séculos. Preservar essa história é mais do que uma obrigação, é uma missão entregue aos jovens ítalos-descendentes nesta data comemorativa de 258 anos de Piracicaba.