Executivo atribui queda na arrecadação à inadimplência
Situação do orçamento do município de Piracicaba, ao término do segundo quadrimestre de 2025, foi apresentada em audiência pública realizada pela Câmara nesta sexta-feira (26)
Foto: Rubens Cardia
A arrecadação menor que a prevista, nos oito primeiros meses do ano com ISSQN (-6,43%) e IPTU (-1,14%); tarifas de água e esgoto (-7,38%) e taxas de limpeza pública (-3,38%) está relacionada à inadimplência de contribuintes, conforme explicações dadas por integrantes do governo Helinho Zanatta (PSD) presentes na audiência pública convocada pela Comissão de Finanças e Orçamento da Câmara, na tarde desta sexta-feira (26). Eles analisaram as finanças do município ao término do segundo quadrimestre de 2025.
Outras variações percentuais que chamaram a atenção têm outros motivos: juros altos, que fizeram a remuneração do município com aplicações financeiras saltar 115,77% no período, e as operações de crédito, que caíram 53,72% — neste caso, pela opção do prefeito de não contrair empréstimos onerosos.
Com a taxa Selic a 15% ao ano, a Prefeitura decidiu evitar novas dívidas para não ter de arcar com juros altos — com isso, as operações de crédito entre janeiro e agosto somaram R$ 69 milhões, ante os R$ 149 milhões previstos originalmente na Lei Orçamentária de 2025.
“Não é uma queda de arrecadação; é uma gestão de recursos para não se pagar mais multa e juros, porque são muito altos. Pode ser que haja um outro tipo de operação, mas não com esses juros, que estão bem abusivos”, disse Karla Pelizzaro, secretária municipal de Finanças.
Presidente da Comissão de Finanças e Orçamento da Câmara, o vereador Josef Borges (PP) fez a maior parte das perguntas sobre itens das planilhas que careceram de contextualização nos cerca de 18 minutos da demonstração, feita pelo Executivo. “No ISSQN, a previsão era de R$ 277,4 milhões e houve uma arrecadação de R$ 259,6 milhões, gerando um resultado final de -6,43%. Por que esse resultado é negativo?”, perguntou o parlamentar.
“Fomos até à tributação ver o que estava acontecendo e chegamos à conclusão de que é por conta da inadimplência. Os lançamentos estão sendo feitos, mas não está tendo uma efetividade de pagamento por parte da pessoa prestadora de serviço”, respondeu Karla Pelizzaro, que atribuiu o quadro a possíveis dúvidas de contribuintes sobre a implementação, em fase experimental, do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) a partir de 2026, como parte do novo modelo tributário nacional.
A inadimplência também foi apontada pela secretária municipal como motivo por trás das expectativas frustradas de arrecadação com o IPTU. “Água e luz, se você não paga, cortam, mas o IPTU demora: é inscrito em dívida ativa, vai para cobrança, então sempre há uma queda [na arrecadação]. Sempre fazemos a previsão em cima da arrecadação dos últimos três exercícios, mas, mesmo assim, estamos vendo a inadimplência aumentar”, afirmou, repetindo as explicações para a queda na arrecadação de taxas urbanas e ITR.
O procurador-geral do município, Marcelo Maroun, disse que a Prefeitura está “reestruturando toda a dívida ativa e a execução fiscal”, contando com a atuação de servidores e a aquisição de software que tornem “mais efetivas” as cobranças de devedores. “Essa situação de que não se paga IPTU, nós estamos acabando com isso, até porque é uma questão de isonomia, um tratamento igual para quem é bom pagador.”
A outro questionamento feito por Josef Borges, sobre a arrecadação com tarifas de água e esgoto ter ficado 7,38% abaixo da estimada para os oito primeiros meses do ano, o diretor administrativo e financeiro do Semae (Serviço Municipal de Água e Esgoto), Emerson Navarro, também relacionou o número à inadimplência, ponderando, no entanto, que ela se mantém em patamares estáveis desde a pandemia.
“Fizemos uma previsão de arrecadação e não está se confirmando. A nossa inadimplência varia muito: até 90 dias, que é a partir de quando pode ser cortado o fornecimento, ela geralmente é alta; mas quando se consolidam os 90 dias e é a hora que vamos fazer o corte, ela está girando em torno de 8%. A inadimplência tem se mantido nos níveis em que estava, não aumentou, e estamos tentando combatê-la da melhor maneira possível. Então, não tivemos um agravante, mas também não conseguimos aumentar a receita nesse início de ano”, disse o dirigente.
Tanto Karla Pelizzaro quanto Emerson Navarro fizeram menção ao contingenciamento no Orçamento feito pela gestão Helinho Zanatta no início do ano, diante das incertezas sobre a arrecadação ao longo de 2025. Até agosto, a Prefeitura teve R$ 1,897 bilhão em receitas e R$ 1,478 bilhão em despesas, resultando num superávit de R$ 419 milhões ao final do período.
O Semae arrecadou R$ 266,6 milhões e gastou R$ 190,4 milhões, também um superávit, de R$ 76,2 milhões. O Ipasp teve déficit de R$ 62,6 milhões e a Fumep (Fundação Municipal de Ensino de Piracicaba), de R$ 2,4 milhões. A Câmara teve despesas de R$ 35,9 milhões em oito meses. Na divisão segundo os órgãos que geram receitas, a Prefeitura arrecadou em oito meses 69,46% do que estava previsto; o Semae, 53,81%; o Ipasp, 99,35%; e a Fumep, 54,11%.
“Dos R$ 495 milhões previstos, arrecadamos R$ 266 milhões. E, até o momento, só fizemos a liquidação de R$ 190 milhões, então, em que pese as receitas não estarem sendo executadas, os gastos também estão sendo contidos”, pontuou o diretor administrativo e financeiro do Semae.
“Quando montamos o orçamento, os R$ 495 milhões contavam com R$ 88 milhões de recursos externos, mas até o momento usamos apenas R$ 5 milhões, por isso a arrecadação do Semae atingiu só 53% do previsto, porque não estamos utilizando fonte externa de recursos em decorrência do custo desse dinheiro”, completou.
RECEITA COM IMPOSTOS - Por conta do contingenciamento, as despesas da administração ficaram 8% aquém dos R$ 2,058 bilhões que estavam previstos para o período. Com exceção do salto de 31,35% registrado com o pagamento de juros e encargos de dívida (que alcançou R$ 19,3 milhões, quando se previam R$ 14,7 milhões), todas as outras despesas caíram, com destaque para custeio (-8,61%), amortização da dívida (-35,54%) e investimentos em obras, desapropriações e equipamentos públicos (-35,76%), que consumiram R$ 62 milhões a menos que os R$ 173,5 milhões previstos.
A cautela também se reflete nas despesas até agosto: completados dois terços do ano, a Prefeitura liquidou 59,9% do previsto para 2025; o Semae, 40,71%; o Ipasp, 50,52%; a Câmara, 57,25%; e a Fumep, 63,19%.
Em razão de “compensações” que ocorrem entre fontes de receitas que superam as estimativas originais e aquelas que frustram as expectativas, a arrecadação nos oito primeiros meses do ano ficou somente 0,52% abaixo do previsto, com uma diferença de R$ 12 milhões entre os R$ 2.297.883.494 estimados e os R$ 2.285.855.771 que de fato entraram em caixa.
Das oito principais fontes de receitas do município previstas até agosto, cinco tiveram arrecadação menor que a projetada: ISSQN (-6,43%), IPTU (-1,14%), tarifas de água e esgoto (-7,38%), Fundeb (-3,74%) e operações de crédito (-53,72%).
Por outro lado, ICMS (+1,83%), IPVA (+1,25%) e transferências federais e estaduais para a saúde (+23,55%) vieram acima do previsto. O aumento no último item foi atribuído à conquista de R$ 60 milhões pelo prefeito em verbas federais para a área.
Em termos percentuais, as fontes que tiveram as maiores altas em arrecadação foram Imposto de Renda (4,44%), remuneração de aplicações financeiras (115,77%), assistência social (5,17%), IPI (12,17%) e o item classificado como “outros” (20%), o qual inclui receitas advindas de multas e ônus de sucumbência, por exemplo.
A secretária municipal de Finanças ressaltou que a arrecadação acima do previsto em algumas fontes de receitas compensa a expectativa frustrada em outras. “Se juntar todas, a queda é menor, mas está tendo uma queda e daí a necessidade de segurar a receita. Por isso, houve o contingenciamento da despesa no começo do ano, porque já tínhamos a perspectiva de que a receita não ia ter a arrecadação prevista até o final do exercício e para não ter um déficit orçamentário e financeiro. O contingenciamento é importante até que tenhamos a efetividade da arrecadação das receitas”, comentou Karla Pelizzaro.
O total arrecadado pelo município de janeiro a agosto alcançou R$ 2,286 bilhões, 67,99% dos R$ 3,362 bilhões previstos para 2025 pela Lei Orçamentária Anual.
Entre os itens com a obrigação de cumprir limites legais em relação à receita corrente líquida, a despesa com pessoal ficou em 38,32% (o máximo é de 54%); a dívida consolidada líquida, cujo teto é de 120%, está em -22,58% (o número negativo significa que o município possui mais disponibilidade do que passivos a longo prazo); e as operações de crédito, que podem atingir no máximo 16% da receita corrente líquida, somam 3,79%.
A dívida de longo prazo da Prefeitura soma R$ 275,793 milhões. Desses, R$ 186,791 milhões são operações de crédito com a Caixa Econômica Federal (R$ 53,671 milhões), o Finisa (R$ 111,502 milhões) e a Desenvolve SP (R$ 21,618 milhões), enquanto R$ 35,239 milhões são de parcelamentos de encargos previdenciários e R$ 53,793 milhões, de precatórios judiciais. Já a dívida de longo prazo do Semae alcança R$ 20,9 milhões, sendo R$ 11,1 milhões do Finisa e R$ 9,67 milhões de empréstimo da Caixa Econômica Federal.
QUESTIONAMENTOS DE VEREADORES - Relator da Comissão de Finanças e Orçamento, Rafael Boer (PRTB) questionou se a arrecadação ter ficado R$ 12 milhões abaixo do que estava prevista para os oito primeiros meses de 2025 “seria normal ou algo para ficarmos um pouco mais preocupados?” e as receitas menores com ISSQN são “por conta da economia de modo geral?”.
Karla Pelizzaro respondeu entender que a arrecadação abaixo da estimada, “de uma maneira geral, está vinculada, sim, às mudanças da reforma tributária e à economia nacional”. “O previsto é para ser realizado. Então, é preocupante, por isso as iniciativas do prefeito já no começo do ano, essa gestão de contingenciamento de despesas e cortes, porque não sabemos se a receita vai se cumprir até o final.”
O vereador André Bandeira (PSDB), que é membro da Comissão de Finanças e Orçamento, defendeu a participação de mais representantes do Executivo na audiência pública. “Este é o momento para tirarmos dúvidas e fazermos colocações referentes a secretarias pontuais. É importante termos outros secretários, das pastas específicas, para que eles possam também fazer os seus apontamentos. A secretária Karla, por mais competente que seja, não sabe todas as nuances que acontecem dentro da Educação, da Saúde e de outras secretarias mais.”
O parlamentar observou que, apesar de os representantes do Executivo atrelarem ao contigenciamento o fato de o percentual das despesas estar abaixo do que fora previsto até agosto, o resultado orçamentário foi de superávit no período tanto para a Prefeitura, com R$ 419 milhões, quanto para o Semae, com R$ 76 milhões.
André Bandeira também chamou a atenção para o gasto com pessoal estar em 38%, abaixo do teto de 54% das receitas correntes líquidas, o que permitiria mais investimentos na categoria. “Continuamos sem ter uma valorização do servidor público como foi prometido”, lamentou, ao propor à administração que avalie a possibilidade de transformar os servidores celetistas em estatutários “para dar um gás no Ipasp”, visto que hoje há entendimento no Supremo Tribunal Federal autorizando esse tipo de mudança.
Em resposta, tanto Karla Pelizzaro quanto Emerson Navarro disseram que o dinheiro em caixa de Prefeitura e Semae deve-se a despesas que estão programadas, a exemplo de “reservas de licitação que estão sendo homologadas”. Sobre o funcionalismo, o procurador-geral do município comentou que a mudança no regime de previdência sugerida por André Bandeira “passa por uma análise muito ampla, de responsabilidade com o erário”, e que “não dá para simplesmente, numa canetada, transformar isso”.
A vereadora Silvia Morales (PV) destacou que parte das receitas do Executivo no período advém de recursos enviados a Piracicaba pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Com isso, pode sobrar um pouquinho das receitas que entram via IPTU, ISS” para outras despesas, disse a parlamentar, para quem “a Prefeitura precisa sempre investir e pensar na qualidade de vida dos munícipes”.