Pais, professores e conselhos pedem ajustes no edital de contratação de cuidadores em audiência pública
O edital é para o atendimento de alunos da rede municipal de Educação com deficiências
Foto: Rubens Cardia
Representantes da sociedade pedem a revisão do edital para a contratação de cuidadores para crianças com deficiências da rede municipal de Educação. O debate sobre o assunto se deu durante audiência pública realizada ontem na Câmara Municipal de Piracicaba, com base em requerimento assinado pelas vereadoras Rai de Almeida (PT) e Silvia Morales (PV), além do vereador Cássio Luiz Barbosa (PL).
Rai, ao presidir o encontro, lembrou que o edital de Pregão Eletrônico nº 178/2025, aberto pela Secretaria de Educação, é alvo de inquérito pelo Ministério Público diante das reclamações da comunidade escolar quanto às atribuições previstas, que seriam incompatíveis com a função de cuidador, além da formação insuficiente para a atividade.
Convocada para a audiência pública, a secretária municipal de Educação, Juliana Vicentin, fez uma apresentação sobre o conteúdo do edital, na qual demonstrou a atual situação da pasta, que enfrenta o desafio de atender a um aumento expressivo no número de estudantes com deficiências na rede.
Ela disse que esse número saltou de 383 crianças atendidas pelo Numape (Núcleo Municipal de Apoio Pedagógico de Educação Especial), há 10 anos, para 1.839 em 2025, dos quais 1.200 são autistas e 1.098 possuem indicação para profissional de apoio. Disse ainda que, atualmente, o Numape dispõe de 83 professores para atendimento.
“A quantidade de alunos com deficiências apresenta essa curva exponencial e a rede não encontra mais professores para dobrar (realizar hora-extra para atender em mais de um período de trabalho)”, afirmou a secretária. No entanto, ela garantiu que os cuidadores vão trabalhar apenas no autocuidado dos alunos e não terão função pedagógica.
“A responsabilidade pela educação é do professor regente da turma e não do cuidador, que atua de forma complementar. O cuidador garante a participação dos alunos nas atividades com segurança e dignidade. O cuidador não substitui o educador e não vai cuidar do pedagógico”, garantiu.
Ela defendeu ainda que a legislação permite a contratação de cuidador com nível médio de escolaridade e que a secretaria prepara uma instrução normativa sobre o pregão, que será apresentada para a Comissão de Educação da Câmara.
A representante do Numape, Vanessa Souto Sturion, disse que o núcleo vai avaliar a necessidade de cada criança. “As crianças que podem contar com esse apoio vão ter e o Numape vai acompanhar de perto porque esse é o nosso trabalho. Trata-se de um recurso a mais que estamos trazendo”, afirmou.
Apesar das explicações das representantes da Secretaria de Educação, o edital recebeu críticas por parte dos conselhos representativos. A vice-presidente do CMDCA (Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente), Taís Marino, disse que o edital foi recebido com preocupação pelos conselheiros.
“O edital traz a formação e funções genéricas para os cuidadores e isso coloca em risco o desenvolvimento e integridade das crianças”, avaliou. “O apoio da escola precisa ser real e executado por profissionais qualificados. Por isso, o CMDCA defende revisão do edital, ouvindo professores, especialistas e principalmente as famílias”.
No mesmo sentido, o presidente do Conselho Municipal de Educação, André Calazans, disse que é preciso resolver o problema das dobras dos professores, mas que alguns itens do edital preocupam, principalmente os quesitos de atribuições para os cuidadores que apresentam componentes pedagógicos.
“O conselho prepara um documento para solicitar a revisão desses pontos, para que sejam colocadas travas para dar a segurança de que esses profissionais serão contratados somente para o autocuidado dos alunos”, disse.
Pais e mães atípicos também se manifestaram na audiência pública pela revisão do edital e apontaram problemas como o retrocesso na inclusão com as contratações; a discrepância entre o conteúdo do edital e a apresentação feita pela secretária na audiência; o número insuficiente de supervisores para acompanhamento do trabalho dos cuidadores e a necessidade de contratação de profissionais qualificados.
Por sua vez, os professores que se manifestaram defenderam a valorização dos educadores e comentaram sobre os prejuízos para a continuidade do trabalho com a rotatividade dos cuidadores, que provavelmente deverá ocorrer. Questionaram ainda os custos com a contratação de empresa terceirizada para o fornecimento de cuidadores quando os recursos públicos poderiam ser utilizados para a contratação de mais professores para resolver o problema das dobras.
Ao finalizar os trabalhos, a presidente da audiência pública, Rai de Almeida ponderou que o edital é um indicativo de privatização do ensino público. “Vejo a precarização do serviço e da educação. Um trabalho com crianças atípicas também é atípico”, avaliou, ao defender a contratação de profissionais efetivos, por concurso público, para a prestação desse serviço.
O vereador Cássio Fala Pira destacou os problemas que o município já enfrentou e enfrenta atualmente com a terceirização de serviços públicos essenciais, como ocorre com a área da saúde. Já a vereadora Sílvia Morales também defendeu a revisão do edital e sugeriu a criação do cargo para que os auxiliares sejam contratados por concurso público.
O vereador Gesiel de Madureira salientou o trabalho da Câmara, ao promover o debate e o diálogo com a sociedade e Josef Borges avaliou que as principais dúvidas dos participantes foram esclarecidas. Para o vereador Pedro Kawai (PSDB), que preside a Comissão de Educação da Câmara, o que se apresenta é uma outra forma de atendimento.
“Uma coisa é o professor e outra é o cuidador”, observou Kawai, ao lembrar que todo atendimento deve ser prestado com qualidade. E comentou também sobre as dificuldades para preenchimento das funções de professor por concurso público.