Plantio de baobás resgata ancestralidade na Esalq
Mudas da árvore da vida e discussão sobre racismo ambiental marcam celebração do 20 de novembro na USP em Piracicaba
A manhã de sábado, 15 de novembro, ficou marcada por uma ação de resgate à ancestralidade na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP). Na semana em que é celebrado o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, estudantes, professores e servidores do campus da USP em Piracicaba estiveram presentes no plantio de mudas de baobás, mais conhecidas como árvores da vida.
Em uma ação do grupo coletivo Baobás, com apoio da Comissão de Inclusão e Pertencimento (CIP) da Esalq, as mudas formarão um bosque ao lado do Museu Luiz de Queiroz. “O baobá é também um marco espiritual e simbólico. Em várias regiões do continente africano, ele é considerado sagrado e, em algumas tradições, cultuado como divindade relacionada ao enraizamento, à memória e à ancestralidade. Plantar um baobá é afirmar que o passado não é esquecido: é abrir caminho para que ele respire no presente”, disse a graduanda em Ciências Econômicas, Vitória Carolini da Sila, membro do Baobás, durante a cerimônia.
Segundo os representantes do grupo, a presença de um bosque de baobá também representa um passo simbólico e concreto rumo a uma universidade mais inclusiva, onde os estudantes negros se sintam reconhecidos e representados. “Este plantio é uma manifestação pública de apoio à luta por mais igualdade racial, de gênero e de classe, temas pelos quais os movimentos negros se engajam e que são fundamentais para a construção de uma universidade justa e plural. Trata-se de uma demonstração de que esta instituição valoriza a diversidade e acolhe ativamente a diversidade racial e cultural como parte integrante de sua missão”, afirmou o coletivo, na carta à Diretoria da Esalq, na qual os membros do grupo solicitaram o espaço para o plantio.
Espécies – A árvore baobá pertence ao gênero Adansonia, que compreende oito espécies conhecidas globalmente, sendo uma nativa do continente africano (A. digitata), seis endêmicas da ilha de Madagascar e uma da Austrália. No bosque, foram plantadas seis mudas das oito espécies existentes, incluindo A. digitata, A. madagascariensis, A. perrieri, A. za, A. grandidieri e A. rubrostipa. Entre as espécies plantadas no Bosque de Baobás da Esalq, duas estão classificadas pela IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza) como ameaçadas, sendo uma em Perigo e outra Criticamente Ameaçada.
“Nós, da Comissão de Inclusão e Pertencimento, com o apoio da Diretoria da Esalq e da Prefeitura do Campus Luiz de Queiroz, entendemos a importância de celebrar o Dia da Consciência Negra. Sabemos que o apoio institucional é fundamental para ações protagonizadas por estudantes, que dão visibilidade a essa pauta. Reforçamos a necessidade de valorizar a diversidade, para que a Esalq seja, cada vez mais, um espaço onde todas as pessoas se sintam incluídas e pertencentes”, declarou a professora Simone Lira, presidente da CIP
Racismo ambiental – Além do plantio de árvores, o grupo Baobás organizou também, na tarde de 17 de novembro, o 4º Encontro para a Consciência Negra na Esalq. Este ano, o tema foi Racismo Ambiental e Justiça Socioecológica. Na oportunidade, estudantes, docentes e servidores técnicos da instituição acompanharam as falas de advogada e Vice-Presidente da OAB Piracicaba, Michelle Cavalleri e da pedagoga, militante ecossocialista e assessora parlamentar da bancada feminista na ALESP Raquel Gualberto.
Michelle é membro do Conselho Municipal da Comunidade Negra e participa do Black Sister Law. Ela reforçou a importância da presença de pessoas negras em espaços de liderança e do papel da universidade na promoção da inclusão racial.
“A mensagem que eu trago é que nós podemos chegar onde quisermos, mesmo com barreiras maiores. As pessoas ainda não estão acostumadas a ver pessoas pretas em cargos de liderança, mas a visibilidade é fundamental”. Para ela, é importante que instituições como a Esalq abram espaço para esse diálogo. “Eu nunca imaginei estar aqui, porque, na minha infância, este era apenas um lugar onde eu vinha fazer piquenique. Trazer o povo preto para falar, ocupar e mostrar suas conquistas é um movimento forte”.
Raquel Gualberto destacou a necessidade de compreender as diferentes formas de racismo ambiental no Brasil e o papel da universidade na ampliação desse debate. “O racismo ambiental se manifesta de formas distintas no Brasil. É um fenômeno que afeta tanto comunidades tradicionais, que têm seus territórios ameaçados, quanto populações negras periféricas, mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas”. Para ela, trazer esse debate para a universidade é essencial. “Esse espaço tem o potencial de produzir conhecimento baseado em evidências e dialogar com a sociedade, fortalecendo a luta por justiça climática e racial”.
Na abertura do evento, membros do grupo Baobás fizeram uma sensibilização do público, exibindo imagens do plantio das mudas próximo ao Museu Luiz de Queiroz, e lendo um documento que mostra a importância de debater racismo ambiental na universidade. Conceito surgido na década de 1980 nos EUA, o racismo ambiental é um dos sintomas da crise planetária ambiental que afeta, de forma desproporcional, o que caracterizamos como comunidade vulnerável. Estão inseridas nessa ótica os moradores de ilhas e da costa litorânea, comunidades quilombolas, povos originários e a população majoritariamente negra, concentrada às margens das manchas urbanas ou próximo a morros e áreas rurais.



