PORQUE HOJE É SEGUNDA.
Hoje é o melhor dia da semana para procastinar. Não perca a chance, procastine agora, leia este texto já!
Hoje é segunda.
Dos postos de saúde e clínicas cheios, por conta dos atestados médicos.
Do momento da semana onde mais se perde a hora do trabalho. Quando os motoristas de aplicativo mais ganham dinheiro.
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Sinal que é segunda-feira é receber mensagens com corações. Flores, de preferência rosas. Mickey Mouse. Nascer do sol. Com as palavras "Paz", "benção" ou "abençoado", "feliz", "Amor", "Deus", "início" ou "começo".
E se tiver tudo isso junto numa mesma mensagem, melhor ainda. Com certeza, sua semana será abençoada até os limites do insuportável.
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Se Deus descansou no sábado, depois de ter trabalhado a semana inteira, o que fez na segunda-feira seguinte?
É possível que a serpente, sedutora do mundo inteiro, incluído aí o corporativo, tenha aproveitado a preguiça própria da segunda, e neste dia oferecido o Fruto à Eva, estando ela e Adão com os espíritos desarmados, depois da balada do findi?
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Ah, o prazer próprio da segunda-feira! Diferente da excitação da sexta-feira, que traz uma energia renovada, que faz esquecer o cansaço da semana. Que planeja e edifica a expectativa do sábado.
E o prazer próprio do domingo, que descansa da gandaia do dia, ou noite, anterior, mas que recarrega para novos prazeres no restante do fim de semana.
A segunda tem seu prazer no alongamento imoral nos minutos antes do despertar útil que anuncia o começo dos trabalhos. Queremos mais fim de semana, mesmo que em alguns minutos de inutilidade, vencendo o sinal de alarme do celular, ansioso e tropeçante, só para termos o gostinho de nos alongarmos mais um pouquinho na cama, sem despertadores nem alarmas de produtividade.
A espreguiçada que só tem sentido na segunda-feira, pois os outros dias são de senso comum.
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Para quem trabalha em casa, em home office ou outro esquema, desfruta-se mais a segunda-feira, cria espúria do fim de semana.
Podemos escolher espichar o fim de semana, isso não vai gerar culpa. Vou dizer em voz alta: "é por isso que não sou CLT".
Espichar o fim de semana, na verdade, torna-se questão de honra: é não passar a borracha nos dois dias mais felizes da semana, e sim, esticá-los, no limite elástico da nossa sobrevivencia.
Esticamos o domingo, pelo menos até o almoço, quando iremos acordar, revirar a geladeira para esquentar as sobras do domingo.
Mas o domingo já foi esticado no jantar, onde esquentamos as sobras do almoço, ou ainda, sem sobras, margens ou gordurinhas, apelamos para o pão com mortadela, presunto, queijo, ou a margarina nossa de cada dia.
Na verdade, a margarina tem gosto de semana útil.
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Atender os clientes pode esperar até a hora do almoço. Que se estenderá, pachorrento, até as duas, ou três da tarde.
O cochilo depois do almoço é de lei. Então, uma sesta até as quatro, por que não? Para afirmar o fato de que escolhemos esta vida, como disse em voz alta, acima.
Mesmo que as contas do fim do mês insistam na cor do sangue, metáfora do buraco na carteira, ou da linha que ultrapassamos, o limite, o chão do cartão de crédito.
Mas o sangue é vida, e para nós, que trabalhamos por conta – autonomos, microempresários, profissionais liberais – o vermelho é um estímulo, o que nos empurra à frente. É a cor do "corre", do pega pra capar, dos números, da foice bancária sobre a cabeça.
E a semana começa.