Sobre o Fórum de Cultura e seus interesses
O governo municipal precisa estar atento à movimentação de bastidores para que a esquerda volte a liderar a movimentação cultural da cidade
Foto: Guilherme Leite
Como o Conselho Municipal de Política Cultural (Comcult) deve funcionar, em termos de representatividade, para que a produção artística da cidade não seja refém de grupos organizados que acabam definindo a agenda local e do próprio governo? Esta deveria ser a pergunta central a ser respondida durante o encontro realizado na quarta-feira (29), no prédio anexo da Câmara Municipal de Piracicaba, durante o Fórum Plurianual em Defesa da Cultura.
Quem acompanha o setor sabe muito bem como o Comcult costumava funcionar. A articulação de lideranças políticas não só criava dificuldades para a gestão pública, tentando impor interesses, muitas vezes de puro viés partidário e ideológico, como decidia por caminhos que podiam inviabilizar projetos do poder público em andamento.
É fácil exemplificar o que vem acima. Imagine se o movimento de esquerda, que costuma tomar conta do Comcult, decidir que ‘a Orquestra Sinfônica de Piracicaba (OSP) é um trabalho voltado à elite socioeconômica e não merece recursos do poder público’. Para o governo dar continuidade ao seu propósito de subsidiar o projeto precisaria movimentar pessoas em volume suficiente para votar no dia da decisão a fim de derrubar a proposta encaminhada pelos adversários do governo. É simples assim.
Foi por causa disso: do excesso de interferência dos integrantes do Comcult nos projetos culturais do governo, que Luciano Almeida (PP) achou por bem criar um órgão em que ele tivesse maior controle, nomeando, de forma artificial, uma nova representação de classe para falar em nome do movimento cultural da cidade.
Lendo a matéria publicada pela Câmara Municipal sobre o fórum, ficam nítidas as marcas da esquerda nesse interesse de reformulação do Comcult, para que ele volte ao seu antigo formato. É muito difícil fazer com que outros setores de pensamento da sociedade participem desses debates. As pessoas acham, e com razão, uma perda de tempo, uma ação desgastante e improfícua. Por isso, defendem a democracia representativa como sendo a melhor, e não a democracia direta, característica de países autoritários.
Com argumentos válidos, os participantes do encontro no legislativo defenderam as mudanças: “O Comcult hoje possui uma composição que não representa a sociedade civil de fato, o que gerou um descontentamento entre os trabalhadores da cultura”. [...] “Por isso, a reformulação do Comcult foi colocada como a primeira pauta do Fórum e as discussões demonstram que estamos convergentes nessa ideia”. Estas palavras do artista João Scarpa, integrante do PV e do Mandato Coletivo encabeçado pela vereadora Sílvia Morales, são evidências do argumento defendido neste artigo.
O fiasco da decisão de Luciano Almeida, com a instituição da lei que rege o Comcult, publicada em 2022, também fica evidente na conversa. “A participação dos fazedores de cultura é essencial e percebemos isso de forma prática. Houve uma ruptura, uma puxada de tapete, mas não temos nada a ver com o que aconteceu”, destacou o coordenador do conselho, Augusto Neto. “Assumimos a posição firme de que é preciso abrir o Comcult à participação dos artistas e a revisão da lei vigente”.
Quais lideranças estavam na reunião parlamentar? A vereadora Rai de Almeida (PT), a vereadora Sílvia Morales (PV), a deputada estadual Bebel (PT) e o vereador Gesiel Alves Maria (MDB), que deve conhecer muito pouco a história política de Piracicaba, especialmente no setor da cultura. É preciso desenhar?
Atualmente, o Comcult é formado por 12 conselheiros e 12 suplentes, com indicações do Poder Executivo e das instituições autorizadas pela lei, como Senac, Sesi, Sesc, Associação Guarantã, Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba e Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Piracicaba.
Se por um lado Luciano Almeida criou um Comcult para chamar de seu, faltaria visão política do atual governo se o Comcult voltasse a ser um movimento liderado pelos seus adversários. Seria também uma derrota para a cidade, uma vez que a esquerda não representa o panorama artístico de uma cidade tão complexa como Piracicaba.