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Um movimento ideológico contra o desenvolvimento urbano?

Amanhã, o Engenho Central será palco de manifestações avessas à construção do Boulevard Boyes

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mai 19, 2025
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Está programada para amanhã (20) uma audiência pública, às 13h30, no teatro Erotides de Campos, Engenho Central, organizada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio do Estado de SP (Condephaat) para discutir e ouvir a sociedade piracicabana sobre o empreendimento Bulevard Boyes, que será construído na área onde ficam os antigos prédios da Fábrica de Tecidos Santa Francisca, conhecida como Fábrica Boyes, preservando boa parte da arquitetura existente no local.

Há um movimento na cidade tentando descaracterizar o empreendimento, alegando que ele vai destruir a paisagem do “Complexo Beira Rio”, o que envolveria toda a orla do rio Piracicaba. Para este “enfrentamento”, como está sendo configurado o movimento, seus organizadores estão chamando “todas as pessoas interessadas em fortalecer essa luta e defender esse patrimônio localizado no coração de nossa cidade, que é o Salto do Rio Piracicaba.”

Em grupos de WhatsApp, as lideranças do Salve a Boyes – nome dado ao movimento – estão pedindo inclusive dinheiro (PIX) para ajudar na organização da estrutura montada para receber os artistas que estarão na manifestação. Tudo indica, portanto, que o Engenho Central será palco de muito barulho, em forma de contestação a um projeto urbanístico que eles reprovam com argumentos genéricos e de forte teor emocional.

O que deveria ser um encontro para se compreender de fato o projeto dos empresários que vão investir no local, parece estar se tornando um movimento de peso ideológico, que pretende usar de artimanhas espetaculosas em defesa de propósitos políticos e refrear assim uma iniciativa no mínimo louvável, uma vez que os investimentos seriam feitos para dar vida a prédios que estão há décadas abandonados e prestes a se tornar escombros.

A própria deputada estadual Professora Bebel (PT) está envolvida nessa articulação de contestação ao empreendimento. Ela esteve recentemente com Leandro Grass, presidente do Iphan, e com o deputado estadual Guilherme Boulos, famoso pelos seus posicionamentos em defesa de invasões urbanas, visando mudar o parecer do Iphan sobre a Rua do Porto e, mais especificamente, sobre os prédios da Boyes.

Mudanças

O projeto Bulevard Boyes, que inclui a construção de um shopping e de uma torre de hotel, já foi aprovado em todas as instancias legais e poderia, inclusive, estar em construção. A obra até começou, mas foi decidido fazer uma série de mudanças que, segundo seus idealizadores, seria ainda “melhor para a população e para Piracicaba”.

Foi proposta, por exemplo, a inclusão de um museu, a valorização maior dos prédios antigos a serem preservados, abrir uma Pequena Central Hidroelétrica (PCH) para a população saber como funcionava a original construía ali por Luiz de Queiroz, além de ampliar a praça pública, com mais de 7.000 metros quadrados e 60% da área livre para acesso irrestrito à população.

Segundo os empresários em questão, pelos estudos arquitetônicos do projeto proposto, Piracicaba estará à frente, inclusive, do que se faz em países europeus, onde a preservação de prédios históricos é uma regra inconteste, “colocando a cidade na vanguarda mundial”. Na linguagem técnica, “será o primeiro projeto privado de Piracicaba 100% Green Building e também 100% ESG (Environmental, Social and Governance), conectando-o ao Engenho Central, além de ter 100% de sua própria energia hidroelétrica gerada no local pela PCH.

Parecer

Hoje, não há nada no IPHAN que restrinja o início da obra, além do lobby que vem sendo organizado para pressionar pela paralização do empreendimento. No estágio atual, inclusive, a área técnica do IPHAN rejeitou a solicitação do movimento para que fosse tombada toda a área que inclui 351 imóveis da orla do rio, na região da Rua do Porto. De acordo com os empresários do Boulevard Boyes, se isso acontecesse, o valor destes imóveis cairia para menos da metade, “se alguém conseguissem vender algum”. Isto se daria pela burocracia criada, uma vez que qualquer reforma, mesmo a mais simples, como pintura ou manutenção de um telhado, precisaria da aprovação prévia do IPHAN, sendo que o processo poderia tramitar até Brasília, tendo altos custos de papelada e longo tempo de espera.

O parecer técnico do Iphan (401/2024), referente ao Complexo Beira Rio afirma que “embora o complexo tenha relevância em âmbito regional, a qual justifica a sua atual proteção, sua trajetória de construção, ocupação, uso e apropriação social não nos permite estabelecer narrativas que a vincule a processos significativos no plano federal. Assim, com a documentação até agora apresentada e levantada, não vemos razões que permitam considerar o bem como detentor de expressão cultural que justifique o tombamento pelo IPHAN”.

O presidente Lula também foi enfático recentemente, ao comentar sobre a queda do telhado da igreja São Francisco, na Bahia. Segundo ele, não é possível falar em tombamento de patrimônio sem que sejam destinados recursos públicos para preservá-los. Basta observar o próprio Engenho Central. Fala-se que ele está sendo preservado, mas a verdade é que existem ao menos quatro barracões em seu bojo à espera de investimentos e que hoje estão inutilizados, sendo um deles, inclusive, como uma chaminé sob risco de queda.

Ou seja, até mesmo um patrimônio tombado pelo Iphan e em uso carece de recursos financeiros para deixar suas estruturas em condições adequadas que permitam o acesso da população a elas. Já são cerca de 40 anos de espera para esses investimentos no Engenho Central, que não chegam e, tudo indica, não chegarão pelas mãos do governo federal. Os prédios da Boyes, caso tombado, entraria nessa fila de espera, que poderia durar décadas até que algo aconteça, se acontecer. Seria um tiro no escuro e uma aposta no abandono.

Conclusão

Por que não olhar com um pouco mais de carinho essa proposta de investimento dos empresários Piracicabanos na Boyes? Muito dos argumentos apresentados, alegando que o Boulevard Boyes seria o fim de uma história ou a destruição de uma paisagem que marca a identidade de Piracicaba, não procede. Muito pelo contrário, o projeto foi pensado, segundo os arquitetos envolvidos, para valorizar ainda mais a paisagem. Pela legislação, segundo eles, poderiam ser construídos no local prédios com até 31 andares. No projeto final, cada torre – quatro no total – terá 26 andares, pensadas para dialogar com o espaço histórico. Vamos ver o que prevalece, o bom senso de um investimento de alto padrão, que colocará o local em um novo estágio de desenvolvimento urbano, ou a preservação dos escombros, que revelam a inoperância de uma mentalidade passadista e desconectada com a realidade.

Veja o projeto Boulevard Boyes no vídeo abaixo:

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