Uma análise da fala de Lula no JN
Este seria o momento de manter a calma e mostrar que é diferente e não igual a Trump no quesito bílis
Lula em entrevista ao JN (Foto: reprodução)
Quem sou eu na fila do pãozinho? Ninguém. Mesmo assim, como Zé Ninguém, me atrevo a afirmar que Lula está no caminho errado ao tentar enfrentar Donald Trump devido à sobretaxa de 50% às exportações brasileiras para os EUA, com prazo para vigorar a partir de agosto.
Em primeiro lugar, porque ele revela ao grande público, em entrevista ao Jornal Nacional concedida ontem (10), uma arrogância inadequada ao momento. Agrada, sim, o seu público, os esquerdistas, mas amplia a animosidade com o outro imbecil, o cabeça laranja, que age pelo fígado, o que pode causar ainda mais danos no curto prazo ao lado mais fraco. Este seria o momento de manter a calma e mostrar que é diferente e não igual a Trump no quesito bílis, para serenar o clima e reencontrar o caminho da ordem.
As intenções ‘anti-imperialistas’ de Lula, digamos assim, ficaram muito evidentes quando defendeu uma moeda alternativa ao dólar para o Brics. Nesse momento, o presidente brasileiro revelou sua aversão à economia americana e como a economia ocidental está organizada em relação ao dólar. É uma ideia de ruptura e atende somente aos interesses de países que vivem à margem da democracia, junto aos quais Lula se sente em casa.
Lula abriu também um campo para críticas dos seus opositores internos ao afirmar que a Justiça no Brasil é igual para todos, e sem ficar vermelho. Quem conhece minimamente a história da Lava Jato deve ter ficado com vergonha alheia.
Em quarto lugar, Lula ameaçou, já de forma bem mais velada, os empresários que se simpatizam por Trump. Não é hora de procurar mais inimigos além dos que ele já tem. Lula disse sim que o Itamaraty vai agir. Mas um Itamaraty nas mãos de Celso Amorim e do embaixador Mauro Vieira não precisa se esforçar para fazer bobagem.
Está certo que Trump cometeu uma barbaridade ao misturar em seu argumento para a sobretaxa duas coisas muito diferentes, como o apoio a Jair Bolsonaro, contra o STF e em defesa da liberdade de expressão, fundamentada na 1ª Emenda da Constituição dos EUA, de olho em uma empresa que é de sua propriedade. É miudeza demais para um país que sempre foi referência global. Há quem diga que esses aspectos da justiça brasileira são o de menos, porque o olhar de Trump está no Brics e nas medidas antiamericanas que o grupo de países vem tomando, como a proposta de moeda independente, por exemplo.
Se o propósito de Lula é manter a temperatura aquecida nessa discussão a fim de se fortalecer para as eleições de 2026, o risco que corre não é pequeno, uma vez que há ainda muito tempo para o pleito e a economia nacional está sendo impactada agora pela medida. A Embraer já despencou no pregão de ontem do Bovespa. Uma queda acentuada nas exportações nacionais poderá ser um problema gravíssimo para o futuro político do presidente, se já não o é.
Claro que isso pode não acontecer, Trump voltar atrás, como tem feito com outros países, e o propósito de Lula ser bem-sucedido, assim que o presidente americano perceber que está afetando setores da sua própria economia com a sobretaxa. E ainda, se o Brasil encontrar novos mercados que compensem as exportações brasileiras que poderão ser afetadas.
Mas não dá para ser ingênuo neste aspecto, uma vez que novos mercados não fruto de ações que se realizam do dia para a noite. E é bem mais factível que os EUA encontrem em tempo recorde novos fornecedores de laranja e café, que vão lhe faltar. Talvez o aço seja o maior nó.
Em síntese, pelo estilo de Lula, o clima pode azedar e a casa cair. Mesmo que se fale que as exportações brasileiras para os EUA não são tão relevantes, na visão macroeconômica, e que o superávit da balança comercial entre os dois países pende favoravelmente para os EUA, essas questões são para especialistas. No caso específico do Estado de São Paulo, o impacto do imbróglio é gigante e negativo e pode custar muitos empregos. Para o Ciesp-Piracicaba, idem.