Unimep: Uma história vencida pelo mercado
À revelia de muitos acomodados, a disputa por alunos foi cruel com uma instituição forjada em tempos de monopólio
A venda do Campus Taquaral demarca nova fase da história educacional da cidade. O mercado implacável não tem freios e empreendimentos que não se ajustem à mobilidade do tempo são sempre mais vulneráveis, mesmo que pareçam robustos, como a Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) parecia.
Forjada em período de monopólio da educação, a Unimep teve, sim, oportunidade para repensar sua estrutura e tentar sobreviver à abertura de mercado educacional durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Mas não houve consenso interno para tal e a política implantada por Paulo Renato, então ministro da Educação, revelou-se fulminante para ela.
Esta história não é minha, mas contada por professores que estiveram com o reitor da época para um diagnóstico sobre o que estava acontecendo com a Unimep quando ela começou a perder alunos para centros educacionais privados mais enxutos e versáteis, que nasciam em profusão na região, além das posteriores EaDs.
Até então, fazer universidade era sinônimo de passar em vestibulares concorridíssimos, para ingressar em universidades públicas, claro (USP, Unicamp, Unesp, UFSCar, isso para citar apenas as do estado de São Paulo). Dentre as privadas, havia basicamente duas na região: Unimep ou PUC.
Nesta reunião, foi enfatizado que a tendência era a Unimep perder em competitividade pelo simples fato de seus cursos serem caros, muito caros. Por um quarto do preço de um curso de jornalismo cobrado pela metodista, por exemplo, era possível obter um diploma nas novas instituições de ensino que passavam a ditar as regras do mercado.
Mas na Unimep, ao invés de se encarar a realidade de forma transparente, predominava o discurso panfletário de que ‘educação não é mercado’ e coisas do gênero. A alternativa proposta para o desafio foi de que a Unimep deveria dar um salto e consolidar sua marca como sendo de uma instituição de alto padrão, como suas congêneres PUC e FGV.
“Para garantir o valor elevado das mensalidades, não havia muita alternativa. Caso contrário, o caminho seria fazer os preços despencarem para uma concorrência direta com as novas instituições de ensino”, me disse um dos professores que esteve na reunião.
No entanto, a engenharia da Unimep não permitia muita flexibilidade, porque tudo tinha que passar por assembleias e decisões colegiadas, o que a engessava. “Os professores controlavam tudo”, se dizia. Ambas as propostas foram, protanto, rejeitadas e, em pouco tempo, iniciou-se a fuga em massa de alunos. Até mesmo as ajudas governamentais, como bolsas para alunos carentes, não eram mais suficientes para segurar a catástrofe iminente.
Evidente que, em pouco tempo, o declínio do orçamento coemçou a impactar na capacidade de pagamentos, seja de salários ou de fornecedores. Uma das explicações que se ouvia internamente para o problema era a necessidade de se pagar muitos salários que eram tidos como simples cabides de emprego, sem relação direta com o sistema educacional. Mas enquanto isso foi possível, ninguém reclamou.
Até que se chegou ao limite da impertinência e da inoperância, imperando a velha frase popular: “em casa onde não há pão, todo mundo grita, mas ninguém tem razão”. O resto é pura sangria desatada que afetou o sistema metodista em todo o país. O fundo do poço culminou com a recente Recuperação Judicial. Isso porque o passivo da Unimep fugiu do controle e era preciso estancar legalmente o processo, que prejudicava a todos os envolvidos.
A compra do Campus Unimep pela Holding Cançado e Lessa pode ser considerada uma boa notícia, inclusive à instituição de ensino, que deixa suas marcas para o futuro, seja com a preservação arquitetônica da estrutura do campus, seja com o projeto de criar cursos universitários na área de saúde, ou ainda, com a garantia de que o belo teatro voltará à vida ativa. São sinais de um tempo que se foi, movido pela implacabilidade do mercado.